Crônicas, pensamentos e reflexões.

O conceito de empatia, que tem origem do grego “empatheia” (eu também lembrei do capitão Nascimento falando “estrategia”), referia-se simplesmente a uma experiência emocional intensa. Depois, no século XX, foi adaptado para o alemão como “Einfühlung” e, finalmente, para o inglês como “empathy” pelo psicólogo Edward Titchene ganhando, o significado de: compreender e compartilhar sentimento de outros.

                Porém, a empatia não é característica exclusiva dos humanos, pois, muitos estudos demonstraram que alguns animais compartilham da mesma capacidade; como os primatas, cães, elefantes e, pasmem, os ratos! Deixarei o estudo e resultado sobre a empatia entre ratos ao final deste.

            Bem, antes da empatia propriamente dita, outros conceitos similares existiam desde a antiguidade, como o “Compassio” do latim, que significa compaixão, assim como o “Ren” da filosofia chinesa, que significa benevolência ou humanidade.  

                Mas, para nós humanos, muitas vezes essa capacidade depende de condições, como já fora explicado em estudos sobre a dinâmica dos grupos, onde rivais tendem a desumanização e etnocentrismo. E ainda por Dawkins em “O gene egoísta”, onde ele propões que só nós podemos aspirar decidir pelo altruísmo em contraponto aos próprios genes egoístas.

                A cultura é fator decisivo para que possamos ir além da tendência egoísta natural e optarmos pela empatia. É a vontade de respeitar e compreender o outro antes de atacar, afinal, desenvolvemos um córtex pré-frontal para isso. Evidente que não é fácil! Mas quais são as opções? Aceitar a natureza egoísta e tentar eliminar, a todo custo, o que é contrário até alcançarmos a própria extinção ou exercitar a empatia, num esforço profundo de humildade onde possamos reconhecer os próprios erros, a necessidade do diferente, e usar com sabedoria a nossa incrível capacidade de adaptação e evoluirmos, de fato.

                Sob uma perspectiva evolutiva, quando nossa moralidade baixar a ponto de superar o próprio gene egoísta, quando não considerarmos mais a continuidade dele próprio, a extinção será inevitável, pois, após este limite ser superado, provavelmente não restará nenhum outro.

                O que estamos produzindo culturalmente tende mais ao egoísmo ou a prática da empatia? Está mais para aprendermos com, ou com eliminar o diferente? Que papel a grande mídia e a educação assumiram nessa trajetória da nossa evolução e existência?

Estudo sobre empatia entre ratos:

Pesquisadores realizaram um estudo para investigar a capacidade de empatia em ratos, focando na resposta empática diante da dor de outros ratos. Eles utilizaram um paradigma experimental onde um rato observador testemunhava outro rato recebendo estímulos dolorosos leves.

Resultados:

Os resultados mostraram que os ratos observadores demonstraram comportamentos empáticos, como expressões faciais de dor, aumento da vocalização e comportamentos de cuidado em relação ao rato que estava sofrendo. Além disso, os observadores também mostraram maior sensibilidade ao bem-estar do rato que estava em sofrimento, sugerindo uma forma rudimentar de empatia emocional.

Referências bibliográficas

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Custance, D., & Mayer, J. (2012). Empathic-like responding by domestic dogs (Canis familiaris) to distress in humans: An exploratory study. Animal Cognition, 15(5), 851-859.

Hare, B., & Woods, V. (2013). The Genius of Dogs: How Dogs Are Smarter Than You Think. Penguin Books.

Plotnik, J. M., de Waal, F. B. M., & Reiss, D. (2006). Self-recognition in an Asian elephant. Proceedings of the National Academy of Sciences, 103(45), 17053-17057.

Bates, L. A., Poole, J. H., & Byrne, R. W. (2008). Elephant cognition. Current Biology, 18(13), R544-R546.

Marino, L. (2002). Convergence of complex cognitive abilities in cetaceans and primates. Brain, Behavior and Evolution, 59(1-2), 21-32.

Reiss, D., & Marino, L. (2001). Mirror self-recognition in the bottlenose dolphin: A case of cognitive convergence. Proceedings of the National Academy of Sciences, 98(10), 5937-5942.

Bartal, I. B., Decety, J., & Mason, P. (2011). Empathy and pro-social behavior in rats. Science, 334(6061), 1427-1430.

Dawkins, R. (1976). O gene egoísta. Oxford: Oxford University Press.

Hewstone, M., Rubin, M., & Willis, H. (2002). Intergroup Bias. Annual Review of Psychology, 53, 575-604. doi:10.1146/annurev.psych.53.100901.135109.

O poder do medo

Segundo a neurociência, damos mais valor àquilo que nos ameaça que a um possível benefício. Isso é de fácil compreensão, pois, se nossos ancestrais tivessem prestado mais atenção à árvore carregada de frutos que ao tigre que estava por perto, provavelmente não estaríamos aqui. Mas, vamos lá; estamos falando de questões objetivas de sobrevivência, mas para o nosso cérebro, porém, tanto faz a veracidade da ameaça se ele compreender a situação de tal forma.

                Diante da ameaça (real ou não), imediatamente a amigdala¹ avalia a situação e prepara uma resposta rápida (ativando a liberação de noradrenalina e adrenalina) e decide, por fim: partir para a briga ou sair correndo? Mas as coisas não são tão simples assim… O hipocampo², dependendo das experiências traumáticas, pode levar a respostas desproporcionais deixando as pessoas ao redor sem entender absolutamente nada.

                Pelo ponto de vista da psicanálise freudiana, há consequências, também: um mecanismo de defesa chamado repressão. É mais ou menos como ver aquela coisa medonha no meio da sala, a qual não temos condições de lidar naquele momento e varrermos para debaixo do tapete (o inconsciente, no caso). Porém, assim como podemos tropeçar naquela protuberância no tapete em um momento de distração, podemos esbarrar emocionalmente naquele medo quando uma situação semelhante se apresentar na nossa frente. Isso resultará em ansiedade e depressão, pois as emoções relacionadas ao trauma não foram processadas corretamente, mas simplesmente “varridas”.

                Tendo um pouco de conhecimento sobre o poder do medo, é muito importante que possamos nos proteger quando este é utilizado como instrumento de controle. Vejamos alguns exemplos:

                A mídia de massa tem um papel fortíssimo na disseminação do medo. As notícias sensacionalistas com relatos de violência, catástrofes e ameaças à segurança geram ansiedade. Assim como a propaganda política visa moldar opiniões e comportamento e, da mesma forma, algumas doutrinas religiosas também fazem ou já fizeram.

                Mas quais as consequências disso, afinal?

                O medo pode levar as pessoas a se conformarem, evitando ações por medo das consequências. Além disso, outro fenômeno é a censura autoimposta, que ocorre quando as pessoas passam a evitar de expressar suas opiniões por medo de punição ou julgamento.

                Portanto, é de suma importância analisarmos se o medo é justificável e dimensão dos seus efeitos limitadores. É trazer a questão para o córtex pré-frontal, onde são realizadas as funções executivas, como o controle de impulso, tomada de decisão, regulamento emocional e memória de trabalho. Entretanto, vale ressaltar, também, que esta é a última área do cérebro a se desenvolver e que tal processo pode continuar até os vinte e cinco anos de idade; fato este que me leva a seguinte crítica: Por que é pouco discutida a disseminação do medo, de forma irresponsável, principalmente aos menores de vinte anos, sem levar em conta o pleno desenvolvimento do cérebro que, por consequência favorece as respostas passionais ou são, simplesmente, varridas para o inconsciente onde se transformarão em problemas futuros? Há alguma advertência que considere tais fatos antes da prática destes?

                Dizem que os responsáveis são como o córtex pré-frontal temporário das crianças e adolescentes. Mas e se esses não estiverem disponíveis ou não tiverem tal conhecimento? Incentivamos a formação de mais profissionais de saúde mental pra tentar resolver o problema depois?

                ¹ A amigdala é uma região localizada nos lobos temporais do cérebro. Ela tem um papel crucial no processamento de emoções e na regulação do comportamento.

                ² O Hipotálamo atua como elo entre os sistemas endócrino e nervoso. Entre suas funções estão a regulação de fome, sede e pressão arterial. Produção de hormônios que estimulam ou inibem a hipófise. Age, também, na liberação de hormônios como o antidiurético e a ocitocina.

Referências bibliográficas:

Freud, S. (1898/1976). Interpretação dos sonhos (Vol. 4). São Paulo: Imago.

Freud, S. (1930 [1929]). O mal-estar na civilização (Vol. 21). São Paulo: Companhia das Letras.

Freud, S. (1933 [1932]). Por que a guerra? (Vol. 22). São Paulo: Companhia das Letras.

Freud, S. (1919). O Medo e a Repressão na Psicanálise: Obras Completas de Sigmund Freud.

Zito, A. (2008). Religion is Media: Obras Completas de Sigmund Freud.

Knapp, G.(2010). Estudos sobre a mídia na análise do comportamento: Revista Brasileira de Ciências Sociais (RBCS).

Bennett, M. R., & Hacker, P. M. S. (2022). Philosophical Foundations of Neuroscience. John Wiley & Sons.

Imagine, nem que seja por um instante, a admiração pelo próprio talento e não pelo ídolo. Tente refletir sobre apreciar a composição além do compositor, o desempenho acima da personalidade, e o exemplo além do líder.

                Tal reflexão me ocorreu após assistir a um vídeo sobre um experimento social, onde o violonista Joshua Bell aceitou tocar em uma estação de metrô em Washington, D.C., sem ser anunciado e como um desconhecido. Com um violino de trezentos anos que vale milhões, Bell tocou durante quarenta e cinco minutos e só sete pessoas pararam para ouvi-lo tocar. Geralmente, Bell costuma lotar eventos onde o valor cobrado chega a quinhentos dólares por pessoa. Então, o que aconteceu afinal?

                Alguns atribuíram o fenômeno ao preconceito, pois, para a maioria das pessoas, não parecia concebível a ideia de que alguém realmente talentoso estivesse tocando em uma estação de metrô em troca algumas moedas. Porém, o que houve com o reconhecimento do próprio talento que ecoava por toda parte através de uma execução incrível?

                A associação entre talento e ídolo, mesmo que útil no que se refere a exemplo, é, por outro lado, incoerente com a valorização do próprio talento. Impõe condições a liberdade da simples apreciação de dons que são heranças de toda a humanidade. Até porque, quando um ídolo decepciona em qualquer outro aspecto da sua vida, o próprio talento tende a ser desvalorizado. O que de fato apreciamos, afinal?

                Por que a dificuldade em valorizar primeiramente o talento, por si só, e só depois a dedicação daquele que o devolveu ao mundo em forma de expertise, como diria o professor Clóvis de Barros Filho?  

                Ídolos são pessoas que comentem erros, que não agradam a todos, que estão submetidos a sua condição humana. Porém, podem manifestar seus talentos! E me parece um equívoco limitar a apreciação de talentos quando os restringimos a figura da personalidade que o expressa.

                “Aqui sou uma espécie de elefante branco para eles, e eles são macacos para mim.” — Albert Einstein se referindo aos brasileiros. Independente do contexto ou da época, ainda soa ofensivo (pelo menos para mim), mas há como negar sua contribuição na área da física teórica? Definitivamente, não!

                É por isso que estou aqui, falando sobre a subversão dos ídolos. Essa subversão nada mais é do que a valorização de qualidades, dons e talentos (ou como queira chamar) acima das personalidades passíveis de equívocos e além das opiniões pessoais sobre eles. Isso é libertador.

                Vídeo do experimento social com Joshua Bell