Crônicas, pensamentos e reflexões.

O poder do medo

Segundo a neurociência, damos mais valor àquilo que nos ameaça que a um possível benefício. Isso é de fácil compreensão, pois, se nossos ancestrais tivessem prestado mais atenção à árvore carregada de frutos que ao tigre que estava por perto, provavelmente não estaríamos aqui. Mas, vamos lá; estamos falando de questões objetivas de sobrevivência, mas para o nosso cérebro, porém, tanto faz a veracidade da ameaça se ele compreender a situação de tal forma.

                Diante da ameaça (real ou não), imediatamente a amigdala¹ avalia a situação e prepara uma resposta rápida (ativando a liberação de noradrenalina e adrenalina) e decide, por fim: partir para a briga ou sair correndo? Mas as coisas não são tão simples assim… O hipocampo², dependendo das experiências traumáticas, pode levar a respostas desproporcionais deixando as pessoas ao redor sem entender absolutamente nada.

                Pelo ponto de vista da psicanálise freudiana, há consequências, também: um mecanismo de defesa chamado repressão. É mais ou menos como ver aquela coisa medonha no meio da sala, a qual não temos condições de lidar naquele momento e varrermos para debaixo do tapete (o inconsciente, no caso). Porém, assim como podemos tropeçar naquela protuberância no tapete em um momento de distração, podemos esbarrar emocionalmente naquele medo quando uma situação semelhante se apresentar na nossa frente. Isso resultará em ansiedade e depressão, pois as emoções relacionadas ao trauma não foram processadas corretamente, mas simplesmente “varridas”.

                Tendo um pouco de conhecimento sobre o poder do medo, é muito importante que possamos nos proteger quando este é utilizado como instrumento de controle. Vejamos alguns exemplos:

                A mídia de massa tem um papel fortíssimo na disseminação do medo. As notícias sensacionalistas com relatos de violência, catástrofes e ameaças à segurança geram ansiedade. Assim como a propaganda política visa moldar opiniões e comportamento e, da mesma forma, algumas doutrinas religiosas também fazem ou já fizeram.

                Mas quais as consequências disso, afinal?

                O medo pode levar as pessoas a se conformarem, evitando ações por medo das consequências. Além disso, outro fenômeno é a censura autoimposta, que ocorre quando as pessoas passam a evitar de expressar suas opiniões por medo de punição ou julgamento.

                Portanto, é de suma importância analisarmos se o medo é justificável e dimensão dos seus efeitos limitadores. É trazer a questão para o córtex pré-frontal, onde são realizadas as funções executivas, como o controle de impulso, tomada de decisão, regulamento emocional e memória de trabalho. Entretanto, vale ressaltar, também, que esta é a última área do cérebro a se desenvolver e que tal processo pode continuar até os vinte e cinco anos de idade; fato este que me leva a seguinte crítica: Por que é pouco discutida a disseminação do medo, de forma irresponsável, principalmente aos menores de vinte anos, sem levar em conta o pleno desenvolvimento do cérebro que, por consequência favorece as respostas passionais ou são, simplesmente, varridas para o inconsciente onde se transformarão em problemas futuros? Há alguma advertência que considere tais fatos antes da prática destes?

                Dizem que os responsáveis são como o córtex pré-frontal temporário das crianças e adolescentes. Mas e se esses não estiverem disponíveis ou não tiverem tal conhecimento? Incentivamos a formação de mais profissionais de saúde mental pra tentar resolver o problema depois?

                ¹ A amigdala é uma região localizada nos lobos temporais do cérebro. Ela tem um papel crucial no processamento de emoções e na regulação do comportamento.

                ² O Hipotálamo atua como elo entre os sistemas endócrino e nervoso. Entre suas funções estão a regulação de fome, sede e pressão arterial. Produção de hormônios que estimulam ou inibem a hipófise. Age, também, na liberação de hormônios como o antidiurético e a ocitocina.

Referências bibliográficas:

Freud, S. (1898/1976). Interpretação dos sonhos (Vol. 4). São Paulo: Imago.

Freud, S. (1930 [1929]). O mal-estar na civilização (Vol. 21). São Paulo: Companhia das Letras.

Freud, S. (1933 [1932]). Por que a guerra? (Vol. 22). São Paulo: Companhia das Letras.

Freud, S. (1919). O Medo e a Repressão na Psicanálise: Obras Completas de Sigmund Freud.

Zito, A. (2008). Religion is Media: Obras Completas de Sigmund Freud.

Knapp, G.(2010). Estudos sobre a mídia na análise do comportamento: Revista Brasileira de Ciências Sociais (RBCS).

Bennett, M. R., & Hacker, P. M. S. (2022). Philosophical Foundations of Neuroscience. John Wiley & Sons.

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