Crônicas, pensamentos e reflexões.

Imagine, nem que seja por um instante, a admiração pelo próprio talento e não pelo ídolo. Tente refletir sobre apreciar a composição além do compositor, o desempenho acima da personalidade, e o exemplo além do líder.

                Tal reflexão me ocorreu após assistir a um vídeo sobre um experimento social, onde o violonista Joshua Bell aceitou tocar em uma estação de metrô em Washington, D.C., sem ser anunciado e como um desconhecido. Com um violino de trezentos anos que vale milhões, Bell tocou durante quarenta e cinco minutos e só sete pessoas pararam para ouvi-lo tocar. Geralmente, Bell costuma lotar eventos onde o valor cobrado chega a quinhentos dólares por pessoa. Então, o que aconteceu afinal?

                Alguns atribuíram o fenômeno ao preconceito, pois, para a maioria das pessoas, não parecia concebível a ideia de que alguém realmente talentoso estivesse tocando em uma estação de metrô em troca algumas moedas. Porém, o que houve com o reconhecimento do próprio talento que ecoava por toda parte através de uma execução incrível?

                A associação entre talento e ídolo, mesmo que útil no que se refere a exemplo, é, por outro lado, incoerente com a valorização do próprio talento. Impõe condições a liberdade da simples apreciação de dons que são heranças de toda a humanidade. Até porque, quando um ídolo decepciona em qualquer outro aspecto da sua vida, o próprio talento tende a ser desvalorizado. O que de fato apreciamos, afinal?

                Por que a dificuldade em valorizar primeiramente o talento, por si só, e só depois a dedicação daquele que o devolveu ao mundo em forma de expertise, como diria o professor Clóvis de Barros Filho?  

                Ídolos são pessoas que comentem erros, que não agradam a todos, que estão submetidos a sua condição humana. Porém, podem manifestar seus talentos! E me parece um equívoco limitar a apreciação de talentos quando os restringimos a figura da personalidade que o expressa.

                “Aqui sou uma espécie de elefante branco para eles, e eles são macacos para mim.” — Albert Einstein se referindo aos brasileiros. Independente do contexto ou da época, ainda soa ofensivo (pelo menos para mim), mas há como negar sua contribuição na área da física teórica? Definitivamente, não!

                É por isso que estou aqui, falando sobre a subversão dos ídolos. Essa subversão nada mais é do que a valorização de qualidades, dons e talentos (ou como queira chamar) acima das personalidades passíveis de equívocos e além das opiniões pessoais sobre eles. Isso é libertador.

                Vídeo do experimento social com Joshua Bell

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