Sobre os talentos.
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O vento trouxe uma folha e a colocou sobre minha cama. Eu a peguei, estava secando, não era mais árvore.
Perguntei para a folha por que ela se soltara da árvore e ela me respondeu: – O vento me convidou, disse que me levaria a lugares que eu jamais poderia ver sendo árvore. Perguntei se o vento havia lhe advertido que ela morreria e ela me disse que não. Vi que estava triste.
Tentei consolá-la e lhe contei que ela ainda poderia voltar para a terra e se tornar solo. Ela se recusou me dizendo que outrora fora árvore e via as coisas de cima, era inaceitável que fosse solo e que preferia morrer como folha, secar totalmente, virar pó e se espalhar com o vento.
Lhe contei que mesmo virando pó, ela inevitavelmente voltaria para terra e seria solo. Ela sorriu com melancolia, percebeu que talvez nunca mais pudesse ser folha. Ser árvore.
Me enchi de compaixão e lhe disse que, mesmo que não fosse mais árvore e logo, nem folha, ela ainda seria parte do jardim. Não como a parte que ela não se contentou, mas ainda seria parte.
Ela me fitou seriamente e me perguntou: – Se eu não tivesse me recusado a ser árvore, não teria me tornado folha, porém, o que eu poderia ser depois de árvore?
Sendo árvore daria frutos, seus frutos alimentariam as criaturas e você, como fruto, viveria nelas, seria parte delas. -Respondi.
A folha chorou, então eu a comi. Era amarga.